Condições e etapas para implementação

Os jardins de chuva funcionam bem na maioria das regiões e sua aplicação não se restringe a determinados climas. Porém, os componentes selecionados (especialmente as espécies de plantas) devem ser nativos e bem adaptados às condições climáticas locais [27].

No entanto, há muitos tipos de solo nos quais os jardins de chuva não têm eficácia na infiltração, atuando apenas na retenção. Ainda assim, eles podem se tornar espaços onde a água permanece por tempo demais, o que pode gerar criadouros de larvas se não forem drenados. É de extrema importância que o local seja escolhido com muito critério. No caso de solo argiloso e não drenante podem ser utilizados jardins de chuva com enfoque em filtrar as águas antes do encaminhamento para o sistema de drenagem [34].

Parâmetros técnicos de projeto

Sugerimos as seguintes recomendações e parâmetros técnicos para planejamento de um sistema de jardins de chuva:

Parâmetro técnicoDescriçãoRecomendações
Área da bacia de contribuição a ser controladaÁrea que terá suas águas pluviais direcionadas para o jardim de chuva• A área da bacia influencia no local, tamanho, profundidade, materiais e espécies que deverão ser definidos
• É preciso dimensionar a quantidade de jardins de chuva a serem construídos de acordo com o tamanho da bacia e capacidade de infiltração do solo
Capacidade de infiltração do soloTem influência sobre o desempenho dos dispositivos de infiltração. Se a capacidade de infiltração estiver fora dos limites estabelecidos, medidas infiltrantes como jardim de chuva não podem ser utilizadas• Embora possam funcionar em quase todos os tipos de solo, os jardins pluviais funcionam melhor em solos leves e arenosos em comparação com uma composição de argila mais densa
• O engenheiro de projeto deve trabalhar com um engenheiro geotécnico para determinar as taxas reais de infiltração para o solo no local específico onde ocorrerá a infiltração. Um teste local deve ser realizado na instalação proposta na elevação mais baixa da infraestrutura verde
Nível do lençol freáticoEsta é uma precaução de segurança, uma vez que garante uma drenagem adequada e evita que o lençol freático interfira com o fundo da técnica que inibiria a infiltração• Se o nível do lençol freático for alto (acima de 1m do fundo), a implantação do jardim de chuva só é viável se seu fundo for impermeável
• A profundidade da água subterrânea deve ser determinada por um engenheiro geotécnico no início do processo de projeto
Fragilidade do soloNo caso de medidas de infiltração, alguns tipos de solo podem perder suas características e sofrer desestruturação, mediante presença frequente de água• Mesmo em medidas de detenção ou retenção, isso pode ocorrer, tornando o fundo da estrutura muito barrento. Nestes casos, a implantação de jardins de chuva não é recomendada
• O tipo de alteração do solo depende do tipo de solo atual, por isso é uma boa ideia fazer um teste de solo por um engenheiro geotécnico
Declividade do terrenoAltas declividades restringem a implantação de dispositivos de detenção e infiltração• A implantação de jardins de chuva é inviável em altas declividades
Ausência de rede de drenagemQuando não existe uma rede de drenagem ou um curso d’água nas proximidades em que se possa efetuar a descarga dos volumes armazenados, o uso de medidas de detenção é limitado• Jardins de chuva devem possuir extravasores conectados à rede de microdrenagem, caso ocorram chuvas mais intensas do que a de projeto.
• Na ausência de um local de destino para a descarga, são inviáveis
Disponibilidade de áreaOs jardins de chuva podem ser implantados em ruas com calçadas ou vias largas e trechos livres de hidrantes e garagens ou mesmo nos lotes e residências particulares• Medidas que necessitam de espaços amplos ou com características muito específicas podem ter sua implantação restrita
• Na ausência de lugares nestas condições, sua construção torna-se inviável
Presença de instalações subterrâneasRede de água, esgoto, luz, telefone etc. podem causar interferências e impossibilitar a construção de algumas medidas• Se houver instalações subterrâneas, o jardim de chuva só poderá ser implantado se estas puderem ser relocadas ou se a configuração de projeto da medida puder ser modificada e adaptada
• Consultar órgãos públicos e empresas responsáveis por tais estruturas e solicitar projetos das redes
Afluência poluídaEm algumas áreas de contribuição ocorrem afluências com altas concentrações de poluentes (esgotos e carga difusa), o que pode prejudicar o funcionamento dos jardins de chuva• É possível estudar a viabilidade de um pré-tratamento a montante. Porém, estas podem ser estruturas mais complexas e caras que o próprio jardim de chuva, o que pode inviabilizar sua implantação
• Contudo, estas medidas são indicadas para o tratamento da carga poluente produzida durante a lavagem das ruas de regiões consolidadas, onde a coleta de esgoto esteja implantada
Afluência com alta taxa de sedimentos e lixoLocais onde a varrição de ruas e coleta de lixo não são rotineiras, aliadas a cultura da sua população, causam grande acúmulo de lixo nas ruas, o qual é carregado para a rede de drenagem, trazendo o risco de contaminação do lençol freático• Caso não seja possível controlar a fonte de poluição, deve-se considerar a manutenção na rotina ou estruturas de retenção a montante.
• Assim como no caso da afluência poluída, o projeto do dispositivo de pré-tratamento pode acabar se tornando mais complexo e caro do que a própria medida, inviabilizando sua implantação.
Uso de tecido e não tecido para filtragemA maioria das técnicas de filtração incluem materiais que atuam como uma barreira entre as camadas de solo e agregado, permitindo que o escoamento seja filtrado. Isto é importante, pois evita a migração de particulados de uma camada para a outra, o que evita o entupimento do sistema.• Embora haja exemplos de uso de sombrite, bidim ou geotêxtis em jardim de chuva, geralmente, esses materiais não são recomendados em caso de solo muito argiloso pois pode trazer problema de colmatação e o solo compactado se comportar como uma laje impermeabilizada.
• A seleção dos materiais é um fator crítico para o sucesso da instalação. O engenheiro de projeto deve trabalhar em conjunto com os fabricantes para determinar o melhor material para a aplicação específica.
(Baseado em ANS Global e AECOM, 2021; Delta Institute, 2017; Yazaki et al., 2013)

Seleção da vegetação

Por se tratar de um jardim, as plantas possuem um papel relevante no sistema. Além de cumprir uma função estética, a vegetação absorve e transpira a água e, juntamente com o solo, atua como filtro natural para poluentes orgânicos, sedimentos e outras substâncias.

É difícil definir uma única variedade a ser plantada, dadas todas as condições envolvidas, mas consideramos possível abordar alguns princípios básicos a serem levados em conta na escolha, para que se tenha o melhor desempenho do sistema.

  • Dar preferência a espécies nativas, já que elas são mais resistentes ao clima local e, por consequência, mais tolerantes e adaptadas às flutuações pluviométricas – sejam secas ou inundações [26] [33]. Além disso, exatamente por viver em sintonia com o ambiente circundante, elas também respondem melhor aos parasitas e às ervas daninhas.
  • Considerar as características das raízes, pois as plantas devem ser selecionadas a depender da profundidade e da composição do meio do jardim de chuva: plantas maiores com raízes profundas, por exemplo, funcionam melhor em jardins com bacias mais profundas [33]. Neste sentido, é interessante considerar os arbustos, pois costumam ter raízes bem desenvolvidas, capazes de reter o excesso de água e evitar a erosão no sistema.
  • A escolha das plantas deve ser pensada para melhorar a qualidade da água por meio da fitorremediação – uma técnica que utiliza a capacidade de absorção de contaminantes pela integração de microrganismos presentes nas raízes das plantas para ajudar a diminuir a poluição do solo e da água [34].
  • De preferência, contar com alta diversidade de espécies, já que plantas diferentes podem variar seu desempenho conforme as mudanças das estações no ano. Além disso, a capacidade de absorver nutrientes, minerais e metais também muda entre as espécies.
  • – após grandes chuvas, a água pode ficar acumulada até 48 horas no jardim – e que, ao mesmo tempo, sejam adaptadas a ambiente seco na maior parte do ano. Isso permite uma menor manutenção do sistema e pode dispensar a necessidade de sistemas de irrigação.

Etapas necessárias para a implementação

A figura seguinte traz os passos necessários à implementação de um jardim de chuva. No caso de realização pelo poder público, ressaltamos a necessidade de etapas anteriores ao projeto técnico, como:

  • plano básico ou levantamentos preliminares;
  • termos de referência e levantamento de prestadores de serviços; e
  • processo licitatório.

Além disso, destacamos que, embora o jardim de chuva seja uma solução de aplicação local em pequena escala, ele deve estar inserido em estratégias mais amplas de Soluções Baseadas na Natureza, sendo parte integrante de sistemas de drenagem urbana sustentável. Na prática, pode ser contemplado em políticas setoriais como Plano Municipal de Drenagem Urbana, Cadernos de Drenagem, Plano Municipal de Saneamento Ambiental (PMSA), Lei Municipal de Zoneamento/Uso e Ocupação do Solo, Plano Municipal de Áreas Verdes, e Plano de Adaptação e Resiliência/Ação Climática.

Ao serem implementados em larga escala, os jardins de chuva retêm parte do escoamento pluvial, contribuem para a diminuição do risco de inundações, melhoram a qualidade da água e do solo e promovem a biodiversidade local [34].

Fluxo de implementação Jardim de Chuva

1 – Projeto técnico
Definição de local, área, profundidade, materiais, espécies
2 – Licenças
Ambiental; autorização para interdição do tráfego; autorização do proprietário do lote da calçada
3 – Demarcação da área
Tamanho, forma e profundidades dependerá, especialmente, da pluviosidade, permeabilidade, inclinação, etc
4 – Retirada da cobertura existente
Vegetação, cascalhos, calçamento ou pavimento
5 – Escavação das valas
Geralmente entre 150 mm e 450 mm abaixo do nível do solo original (UGITG)
6 – Instalação das paredes e contenções
Podem ter peças pré-moldadas de concreto ou contenções com o próprio solo retirado
7 – Dispositivos de entrada das águas
Aberturas no meio fio, canos ou concretagem. Pode ter espaço para a coleta de sedimentos
8 – Dispositivos de saída das águas
Ligação de cano perfurado na rede de águas pluviais e preenchimento com brita ou cascalho
9 – Preenchimento com solo
Usar solo escavado adicionado matéria orgânica ou, se for argila pesada, cascalho, pedras ou areia
10 – Plantio da vegetação
e serviços de jardinagem.
11 – Teste com simulação de chuva
Para que sejam detectados possíveis erros de construção ou efeitos não previstos no projeto
12 – Manutenção, monitoramento, avaliação e ajustes